segunda-feira, 15 de março de 2010

Um lugar ao sol




Não sou crítica de cinema, nem tenho essa pretensão na minha vida, mas assisti um filme ontem que me deixou intrigada e não consigo ficar calada. Foi o curta "Um lugar ao sol"do cineasta pernambucano Gabriel Mascaro. Ele filmou moradores de 9 coberturas brasileiras entre Recife, Rio e SP, onde os mesmos davam depoimentos sobre os prazeres de se viver um pouco mais perto do céu.

Entre depoimentos às vezes alienados demais, como o da mulher que disse que morar em cobertura era bom porque ela via o tiroteio no Morro D. Marta da varanda e as balinhas pareciam fogos de artifício...Pasmem..... outros super interessantes como aqueles que falavam que moravam em coberturas simplesmente porque queriam morar em casas com jardim e área para cachorros, mas não encontravam tal modelo na cidade.

Achei a intenção de Gabriel de dar voz a uma parte da elite brasileira super positiva. Geralmente essas pessoas nunca tem chance para serem ouvidas e elas tem algo a dizer, por que não? O que me deixou saindo da sala achando o filme um pouco manipulador e preconceituoso foi o fato de que o cineasta encarou os entrevistados como fantoches. Todas as opiniões foram colocadas na edição de uma maneira que o telespectador sentia desprezo por aquele cidadão, jogando imagens de transeuntes andando sob o sol quente na cidade intercaladas com piscinas em decks de madeira de lei.

Como o do carinha que diz que não é playboy, ele só mora ali porque os pais trabalharam muito para que ele estivesse ali. E ele não está certo? Ele escolheu viver ali? E se vive ali, ele acha ruim? Você que está lendo acharia ruim essa escolha dos seus pais? Quem não ia gostar de morar numa cobertura duplex? Pois todos no cinema riram quando ele emitiu essa opinião.

Claro que o modelo de cidade que eu queria para o Recife, assim como para o resto do Brasil, era aquele modelo de casinhas/aptos conjugados, como a fachada voltada para a rua e o comércio embaixo estimulando a caminhada e a convivência, assim como é em Barcelona, por exemplo, onde podemos encontrar em alguns bairros, ricos e pobres morando nos mesmo quarteirões.

Mas infelizmente o Brasil não seguiu esse cenário e o nosso modelo de cidade promove e valoriza os grandes empreendimentos imobiliários com grandes muros que se fecham em quadras e piscinas, onde os moradores tem de tudo para não sair de casa, convivendo pouco com a realidade da cidade e prejudicando a dinâmica das relações humanas e o movimento da cidade.

Se o Brasil não seguiu esse modelo e agora? Vamos criticar as elites por que se isolaram em coberturas procurando casas onde não podem viver, pois a violência ataca 20 andares abaixo? Vamos fazer filmes e julgar os ricos por serem consumidores desse modelo de morada? Os ricos não são os culpados. A culpa vem lá de trás, do modelo falho de planejamento urbano que o Brasil adotou no passado.

Ao invés da visão esquerdista de colocar a culpa em quem tem dinheiro (e não pensem que moro numa cobertura por estar escrevendo isso), deveríamos é buscar soluções para resolver esse problema quase sem solução. O cinema, por exemplo, seria um excelente meio de se fazer levar às massas (elite ou não) a mensagem da cidade que devemos construir e remodelar.

Eu sei que "Um lugar ao sol"é um filme de crítica, e ele veio ao mundo com esse objetivo. E apesar dos meus achismos um pouco negativos, acho que só por promover essa discussão e me fazer escrever esse textão já valeu. Pior se não tivesse sido filmado. Mas fica aqui a opinião da arquiteta, Gabriel.


Um comentário:

  1. Marília, nem achei que nossas opiniões são realmente diferentes sobre o filme. Também achei positiva a iniciativa de filmar a elite brasileira e também achei Mascaro manipulador na edição. Acho que a diferença na sua abordagem foi defender o morador de cobertura, enquanto eu me abstive do assunto. Mas já que você abriu aqui, concordo totalmente. Eu mesmo adoraria morar em uma. Paz, silêncio, piscina e céu aberto. Que maravilha.

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